Romance de verão

Bruno Garofalo
4 min readOct 15, 2018

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Estar de férias me fazia perder a noção do tempo. Eu não me preocupava com coisas triviais e não sabia há quantos dias estava ali, mas sabia que a passagem de volta era para o dia seguinte. Na verdade, tudo era trivial perto do que eu estava vivendo.

Talvez olhando pra ela sem qualquer perspectiva, qualquer um diria que era uma pessoa qualquer. E é óbvio, mas digo mesmo assim: eu fui além e vi o que as outras pessoas geralmente não veriam. Eu a conheci de verdade. E aquilo, que até então não tinha nome, se tornou o meu romance de verão.

Eu estava constantemente dividido entre o fervor de aproveitar os momentos como se o amanhã não existisse e o temor crescente com a certeza de que ele chegaria. Às vezes eu tremia quando segurava a mão dela. Ela me perguntava o porquê e eu não conseguia explicar. Me disseram uma vez que eu tinha dificuldade para me expressar, e eu não levei a sério até aquele momento. Observávamos o sol se pôr enquanto ainda podíamos. Era um momento digno de ser vivido.

Na última noite nós não dormimos. Eu poderia fazer isso na viagem de volta. Em vez disso, me arrisquei a perguntar o que seria de nós no futuro. Ela deu uma risada curta — não sei dizer se nervosa ou não — e respondeu, da mesma forma misteriosa que me atraía, dizendo que não sabia. Era bonito observá-la e ver que ela de certa forma gostava daquela incerteza do futuro. Eu já pensava diferente. Eu queria uma próxima vez. Eu gostava de ter algo a que me agarrar. Ela era bem mais desprendida do que eu, e eu admirava isso nela.

Nos despedimos, finalmente. Enquanto algo dentro de mim gritava desesperadamente para dizer a ela que eu queria pelo menos algum tipo de contato, para saber quando e aonde ir, mas a rapidez do momento não permitiu que eu dissesse nada. Talvez eu realmente tivesse dificuldade em me expressar. Ela me acompanhou até a rodoviária e até acenou quando o ônibus partiu, como se fosse uma cena de filme. Eu, sentado ao lado da janela, acenei de volta, certo de que aquela seria uma viagem bem longa. E desejando que, também como num filme, eu estivesse apenas sendo encaminhado a um possível final feliz.

Eu não chorei, mas senti o tempo todo uma pressão estranha no rosto. Comecei a pensar naquela situação e em como todas as minhas escolhas haviam me levado até aquele ponto. Foi então que eu percebi algo em que não consegui parar de pensar até chegar em casa. Talvez ela tivesse aprendido isso antes de mim e sabia que as coisas tinham que ser daquela forma. Eu havia vivido um romance de verão. Se eu pudesse definir um ponto positivo e um negativo, eu diria que o positivo é que é uma experiência muito intensa.

O negativo é que ele tem que acabar.

O cancioneiro popular brasileiro tem uma música que diz que “Amor de praia não sobe serra”. E outras coisas mais que definem essa angústia que me acompanhou no caminho de volta. Eu estava, naquele momento, subindo a serra e vendo o tal amor de praia ficando cada vez menor, até desaparecer no horizonte. Talvez tudo isso tenha uma importância, e o fato de ser finito é o que dá o valor. Ou talvez não, e tudo mais só seja um obstáculo que eu deva superar. Já não sabia mais em que acreditar, na verdade. O que eu queria era retornar para aquela praia em uma próxima oportunidade e procurar por ela. Se valeria a pena ou não, só teria um jeito de descobrir.

O poeta Carlos Drummond de Andrade, natural de Itabira-MG, tem em seu poema “Confidência do Itabirano” dois versos que amarram tudo isso que falei até agora:

Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

Assim como Itabira para o escritor, para mim esse romance de verão é hoje uma fotografia na parede. Porém, ela está em uma parede pela qual passo com certa frequência, e paro para observá-la sempre que posso. As lembranças vêm como um soco na boca do estômago, que me tira o ar, e como uma dose de adrenalina que me faz disparar o coração. Eu tenho plena consciência de que o momento daquela fotografia será eterno, por mais que eu não consiga retornar a ele.

Mas como dói.

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Bruno Garofalo

Levando poesia à vida comum. Textos às segundas, com (cada vez menos) raras exceções. Escrevo sobre o que quer que me inspire.