Carta anônima #21

Bruno Garofalo
5 min readOct 24, 2022

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Minha mente é poderosa, e isso é uma bênção.

Nunca tive muitas complicações ou problemas. Quando eu estou bem, a sensação que tenho é que o próprio mundo se dobra a meu favor. Minha vida é repleta de coincidências, e eu percebo uma série de padrões que não perceberia de outra forma.

Sou capaz de imaginar as mais belas cenas nas mais favoráveis circunstâncias. Tudo parece muito real. Meu corpo reage como se os estímulos estivessem, de fato, acontecendo. O nível de visualização que atinjo é de se dar inveja, e pela forma como ela funciona, consigo fazer isso o dia inteiro.

Algumas das coisas que imagino podem até se tornar reais, como já se tornaram, depois que eu as escrevo e as manifesto do lado de fora.

Com sons ela funciona ainda melhor. Se você me disser algo hoje, daqui a dez anos eu me lembrarei da sua voz, do tom da sua fala e exatamente do que você disse. De tanto repetir seu doce nome, das mais variadas formas, tenho certeza de que também nunca o esquecerei.

E como eu tenho pensado…

Minha mente é poderosa, e isso é uma maldição.

Basta uma pequena migalha para dar início a uma possível espiral da tristeza. Ultimamente, eu venho me treinando para ter uma mente cada vez mais focada e menos abalável. Mas existem certas coisas que simplesmente… são mais fortes do que eu.

Principalmente porque a maioria delas são mais fígado do que mente em si. Não adianta respirar, me convencer de que eu tenho que ficar calmo e que nada está perdido. Às vezes, nem esperar adianta.

Os pensamentos me roubam a concentração, porque a eles eu me atenho, e eles vêm com força. Como se chutando as portas, arrombando as janelas, jogando tudo no chão. Perco minha concentração, minha capacidade de foco, minha clareza mental.

Vi um cara numa operação na Ucrânia dizer que a guerra te deixa chapado. Nunca estive em uma — e espero nunca estar — , mas o sentimento que ele descrevia era brain fog, uma espécie de neblina mental. É isso que eu sinto. Enquanto também tenho outros sintomas físicos.

Sinto uma espécie de vazio, ou também como se meus órgãos internos estivessem retorcidos. Sem ar, com um nó na garganta, alguma espécie de náusea. Coisas que descobri desde que experimentei a angústia pura e simples pela primeira vez. O sentimento é até familiar.

E dói. Queima. Machuca.

Minha mente é poderosa, e ela é uma fortaleza quase impenetrável.

O estoicismo me ensinou a não me preocupar com coisas fora do meu controle. Que não importa o que acontece; importa como eu reajo ao que acontece. E também muitas outras coisas a respeito de controle de emoções, pensamentos e ações.

Eu me blindei.

Ao longo de muito tempo, eu fui criando uma casca e, hoje em dia, quase nada mais me abala. É virtualmente improvável que alguém consiga me tirar do sério. Mas não existe defesa perfeita. Não existe escudo impenetrável.

E nas paredes da minha fortaleza existe uma rachadura.

Quase ninguém sabe o que é, ou onde fica. É uma sequência muito longa de acontecimentos que levam alguém até lá. E mais: eu tenho que permitir. Acho que o problema é justamente esse. Se eu não permitir, ninguém entra, ninguém abala de dentro para fora.

Então a solução é me fechar do lado de dentro.

Minha mente é poderosa, e ela pode se tornar um cativeiro.

Uma vez na espiral da tristeza, é relativamente difícil sair. E é um dos pontos negativos de se estar trancado.

Durante o processo de blindagem, eu não senti nada — e percebo isso olhando em retrospecto. Eu passei muito tempo sem me apaixonar, sem amar ou qualquer coisa assim. Eu estava realmente fechado. E, por algum motivo, eu achava que tinha me tornado outra pessoa.

De fato, me tornei. Mas a minha essência continuou a mesma. E era questão de tempo até que eu desse permissão para alguém entrar de novo. Não acho ruim; é só que, na maior parte do tempo, eu estou confinado junto com as minhas neuroses e inseguranças — que eu talvez nunca direi a ninguém quais são.

Tenho outras coisas a dizer. Minha vontade é de rasgar meu peito, deixar sair tudo, e aceitar se nada quiser voltar e eu me tornar uma casca vazia, esperando ser preenchido com algo mais no futuro. Talvez, falando assim, pareça violento demais, mas imagino que a angústia também saia se eu abrir o caminho.

E eu sei que certas coisas estão fora do meu alcance. Não quero impor, não quero controlar, não quero demandar. O que eu quero, na verdade, é bem mais simples, ainda que não seja tão fácil. O problema são as visões que eu tenho através de uma janela embaçada e quebrada, com vidros que me cortam se eu chegar perto demais.

Se eu nada fizer, o tempo passa e eu fico para trás. É uma sensação maldita de impotência, de quem foi derrotado pelas circunstâncias e não recebeu prêmio de consolação. E, por mais que eu faça, às vezes é como se não adiantasse.

Falar o que eu sinto não é suficiente, e pode nunca ser.

Minha mente é poderosa, e você tem ocupado boa parte dela há algum tempo.

Isso também dá poder a você.

Eu abri meu coração. Agora é hora de você abrir o seu. Curtiu? Então deixa suas palmas aí nesse texto se ele fez você refletir ou mesmo sentir alguma coisa. Vale até se te arrancou um sorriso. Se você quiser me acompanhar mais de perto e saber com exclusividade o que eu penso, você pode clicar no botão ao lado da minha foto para me seguir no Medium e sempre ficar de olho nas publicações.

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A importância de escrever memórias

Pensamentos demais, espaço de menos #5

Carta anônima #20

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Bruno Garofalo

Levando poesia à vida comum. Textos às segundas, com (cada vez menos) raras exceções. Escrevo sobre o que quer que me inspire.